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quarta-feira, 28 de dezembro de 2016

As crianças, a vida e os antipsicóticos- Parte 4 e última

Continuação de "As crianças, a vida e os antipsicóticos- Parte 1"
                            "As crianças, a vida e os antipsicóticos- Parte 2"
                            "As crianças, a vida e os antipsicóticos- Parte 3"

Percurso do pensar
1 - Carroças, carros e aviões
2 - Equilíbrio estímulo-córtex
3 - Estratégia "estímulos versus córtex"
4 - Estratégia "córtex versus estímulos"
5 - Cortex versus vida parte 4
     1- Ondas cerebrais, 2- Yoga e Meditação, 3- A vida, 4-Conclusão

Tema

Os cérebros são todos diferentes, todos incríveis, todos com vida própria e cada um diferente em cada momento. Eles são […como a água de um rio que é sempre a mesma e nunca é igual...], bastando [...adormecer e sonhar para ficar diferente com ideias que não tinha antes e de efeitos desconhecidos]*.
[*] - ver "A interpretação dos sonhos", Sigismund Freud
Os cérebros são propriedade privada que, por muito que os controlem, surpresas sempre aparecem. Nunca se pode esquecer que, mesmo em transplantes, o dono tem que ir incluído.

Um "cérebro" de 8 anos a pensar:
-  O cérebro é meu e ele é surpreendente (amazing).

5 - Córtex versus vida

5.1 - Ondas cerebrais

Viver é receber um estímulo e reagir a ele. Fazer esta conexão é o trabalho do córtex durante 24 horas por dia, 30 dias por mês, anos a fio. Se o córtex pára… "o viver" também.

O córtex é um "hospedeiro" de 5 tipos de ondas, ou seja, de vibrações com frequências, fases e amplitudes diferentes. As mais comuns são:

não citando as Epsilon que aparecem nos yogi's quando estão em "animação suspensa", nas Lambda dos monges do Tibet meditando no exterior com temperaturas negativas, quase nus e derretendo a neve à sua volta e também na situação zone, que surge, por ex., na alta competição e em EAC particulares[*].

[*]- Ver "In the Zone, transcendence experience in sports", Michael Murphy, um pequeno livro de 300 pag com 100 pag. de bibliografia (1.545 livros) e "The futur of the body" com 800 pag. (e uma bibliografia de 2.145 livros) com estudos sobre vários métodos de desenvolvimento do Ki e seu uso em várias culturas, religiões e actividades como, por ex., no golf, andar no fogo, êxtase religioso e mesmo o específico caminhar do Tibete (lung-gom), Incas, etc.
Alexandra David-Neel, "Tibete, Magia e Mistério", Ed. Cultura Brasil,  fala do lung-gom, longas e rápidas caminhadas a pé, numa espécie de transe (EAC) em que, com a elasticidade de uma bola, se anda rápido e sem parar um dia e uma noite. Ela refere que o seu treino não é muscular mas sim desenvolver um determinado estado psíquico.

As actividades base para criar esta Zone parecem ser a meditação, consciência corporal (biofeedback?), visualização, práticas mentais, sonho acordado, quinestesia, relaxação, concentração, respiração, esvaziar mente (blank minds) e ritmos.

Em poucas palavras tudo se resume a [… mediante acções voluntárias, gerir situações corpo-mente de modo a provocar outro equilíbrio no conjunto das ondas do córtex], ondas essas que podem ser expressas pelos gráficos:

Estas acções voluntárias de manipulação neural estão "arrumadas" em diversas áreas e disciplinas, desde práticas religiosas institucionalizadas sob a forma de rituais até métodos e técnicas de artes marciais a pretexto de lutas, passando pela Yoga justificadas pela ginástica e Meditação pela procura de comunicar com o "outro lado".

A par de antigas tentativas de pôr o "córtex a alterar-se a si próprio" através de drogas, rituais, técnicas e bruxarias, algumas duráveis até hoje, encontramos agora a ciência a procurar caminhos novos.
Desde a psicanálise, com o terapeuta a servir de espelho para se conversar consigo próprio, até às confissões religiosas (ou não*), que são uma espécie de psicanálise de leigos, até à simples conversa afectiva**, tudo serve para o córtex se auto-transformar e mudar redes neurais, criando novos scripts (programações) de pensares, atitudes e comportamentos.

[*]- Vide a prática nos AA-Alcólicos Anónimos.
[**]- Não falando da educação, marketing, propaganda política  autoritarismo, etc, como formas de instalar decisões nos outros… , ou seja, CONVENCER, ou seja, pressionar neles a auto-criação de novas redes neurais conducente ao desejado. 

Como exemplo de algumas destas técnicas hoje difundidas no quotidiano "leigo", existe a Yoga e a Meditação.

5.2 - Yoga e Meditação

Para pensar Yoga e Meditação a partir de suas explicações "genuínas", é necessário rever conceitos e paradigmas de senso comum, pois nelas as palavras tem significados diferentes. Entre outros, dois conceitos fundamentais a rever são o significado de relaxação e visualização.

A yoga não é uma ginástica com métodos diferentes, nem meditar é um método de pensar. Ambas são métodos de gerir equilíbrios de ondas (frequência, fase, amplitude) no córtex e ambas, na sua prática, contêm factores comuns, entre eles, relaxação e visualização.

Casos interessantes são a Yoga sem posturas utilizada, por ex., em doentes acamados e a meditação "por andar" (e não apenas "durante o andar") utilizada, por ex., no treino de sentir o exterior into (dentro-fora) interior ou, por outras palavras, sentir a integração eu-contexto.
No caso da "Yoga sem posturas" o conceito importante é a relaxação, na "Meditação por andar" é a visualização.

Relaxação

A yoga não é uma ginástica postural e respiratória mas uma espécie de "ginástica meditativa". É a criação de um estado de espírito através de métodos respiratórios, movimentos e posições em equilíbrio tensional.
A "yoga sem posturas" baseia-se em controlos respiratórios[*] e em minuciosos e precisos controlos de sensibilidade muscular. Uma das suas maiores dificuldades está no controlo da relaxação.

[*] - Por ex., por controlar e relaxar músculos respiratórios é possível inalar mais com um pulmão do que com o outro (músculos intercostais internos e externos) ou mudar da respiração toráxica (barriga para dentro, peito para fora) para abdominal (uso do diafragma).

Relaxar não é hipotensionar músculos. Relaxar é equilibrar uma tensão muscular residual mínima mantendo uma mente activa, ou seja, adormecer não faz parte do processo. Pelo contrário, adormecer e relaxar são funcionamentos opostos, quando um começa o outro acaba[*].
No dizer de um teórico […relaxar é ter o corpo sonolento com uma mente bem acordada…], mente bem acordada é o oposto de mente a dormir.

[*] - Quando se diz "relaxa para dormir" quer dizer "fica descontraído (hipotenso) para dormir".
        Relaxar são ondas Alfa e Teta (fase 1 ou 2), dormir são ondas Teta e Delta (50% ou mais).

Como exemplo, o treino de relaxar não deve ser feito deitado (como se faz em muitas aulas de yoga) mas sim sentado, pois neste caso o adormecer é óbvio (cabecear) e o estado muscular (rigidez ou moleza) também são evidentes, pelo que o apoio anti-dormir (não aumentar ondas Delta mas aumentar ondas Alfa) pode ser dado de forma oportuna e fácil*. 
Dizer que a relaxação ou a meditação foram boas porque adormeceram significa que foram más porque elas não são comprimidos para dormir.

[*] - Daqui a dificuldade em doentes acamados.

Na perspectiva do córtex, relaxar significa tirar a dominância das ondas Beta e passar para a dominância de ondas Alfa ou Teta. As culturas orientais (yoga e meditação) nos seus métodos dão algumas "dicas" de actividades corporais facilitadoras do processo, muitas delas no campo da sensação corporal. 
Com algum treino, 5 minutos são suficientes para passar do stress da "balbúrdia de ideias na cabeça" (ondas Beta de 20/40 Hz) para o suave fluir de ondas Teta ou Alfa (04/13Hz) e aí "repousar" 50/60 minutos sem consciência do tempo passar.

Frequências Beta são as frequências da vida quotidiana (nível leve de 13/20Hz ou nível intenso de 20/40Hz), isto é, desde uma vida "calma e operacional" a uma vida "frenética e stressada".

Frequências Alfa e Teta são frequências da meditação. Nesta perspectiva as técnicas de meditar, desde respirações, quinestesia (interoceptiva, proprioceptiva), relaxações, visualizações, ritmos vocais (rezas ou cantilenas), musica, etc, usadas ao longo dos tempos, não são mais que tentativas de gerir qual a predominância das ondas no córtex e cuja expressão pode originar um transe ou um EAC*.
[*]- Estado Alterado da Consciência.

Visualização

As técnicas Budistas tradicionais não aconselham focalização em ideias ou imagens mas sim em sensações, ou seja, insistem na predominância dos "sentires".
É interessante que, nos escritos sobre o "rezar antigo", a insistência não é no "falar" com Deus mas sim no "sentir-se" em Deus. Segundo eles, rezar com a monotonia de ladaínhas e cantilenas cria um estado de hipotonia e hipnótico (rotinas??) redutor do ligar-se a Deus (religare ,i.é., religar, religião).

Esta opinião do "rezar antigo" é interessante sob o ponto de vista da gestão das ondas no córtex. Criar um estado de meditação (dominância de ondas Alfa), inerente a rezar, pode ser obtido por dois modos distintos.
Um deles é, numa predominância das ondas Beta sobre Alfa, pela rotina, reduzir as ondas Beta mas manter diminutas as ondas Alfa (Fig. A].
Por ex. na actividade de lavar a loiça muitas vezes a calma aparece devido à rotina mas isso não significa aumento das ondas Alfa, portanto não se entra em meditação por lavar a loiça.


O outro modo é, na mesma predominância das ondas Beta sobre Alfa, aumentar as ondas Alfa, independente de reduzir ou não as ondas Beta [Fig. B]. Neste caso, o estado meditativo aparece.
No ritual do "rezar antigo", longe da rotina, o EAC desejado aparece com o pretendido religare a Deus. Os rituais propostos, longe de ladaínhas e vocalizações rotineiras, procuram impedir estados hipnóticos e hipotónicos.

A diferença existente nos "rezares" de diferentes religiões é novamente um problema de conceitos, às vezes bem expressos nas "lógicas quotidianas" que tropeçam nos próprios pés.
Quando se diz:

- Gosto dele porque é bonito !!!

é uma frase sem sentido porque deveria ser:

- É bonito porque gosto dele !!!

Na verdade, a causa e a consequência estão trocados. Não é por ser bonito que se gosta, é por gostar que se é bonito. Não se gosta dos filhos porque são bonitos mas são bonitos porque se gosta deles.
Não convém trocar "pés mentais", a relação humana é demasiado complexa para reduzir as suas causas a meia dúzia de itens e valores culturais.

Saber porque se está apaixonado é fácil, […está-se apaixonado porque se está apaixonado…]. Todas as razões que se dão para isso acontecer nunca são a sua causa são apenas factores colaterais* que apanharam "boleia".
[*]- Quando realmente forem a causa real da paixão, então não é paixão é um negócio, quer ele seja económico, social, psicológico, marketing, etc.

Esta diferença é importante para aprofundar a diferença entre olharização e visualização.
Uma analogia, Ver-um-pôr-do-sol:

O prazer de ver um pôr do sol não está em tirar uma boa fotografia (não o impede), nem em construir na mente uma imagem do que vê (olharização). Está em "perder-se lá dentro", sentindo-se por ele envolvido e envolvendo-o, esquecendo o tempo, o espaço e o resto à sua volta. Numa palavra, visualizando-o.
Visualizar é criar uma indução afectiva com uma indução cognitiva, entendendo indução no seu sentido etimológico de acção de levar e trazer. Numa palavra é sentir um "choque"

Uma boa fotografia ou uma boa pintura de um pôr do sol são aquelas que, ao ver, se sente um "soco psico-afectivo", uma alteração no "modo de estar".
Ver um pôr-do-sol e sentir que perdeu e encontrou um modo de estar distinto do que tinha, é uma "visualização". Olhar um pôr-de-sol e não sentir alteração psico-afectiva é apenas "olharização".
Visualizar não é fazer uma fotografia mental por muito boa que seja a descrição, é […sentir com a mente…] um estado afectivo.
Como exemplo, um video com estímulos fotográficos e seus efeitos de "olharização" ou "visualização". A proposta é, depois de ver, se decidir quais são os estímulos que originam um caso e outro e porquê:


Se se analisar a mudança de voz, micro comportamentos e diferentes pulsações (70/80 ou 110/120) é clara a diferença no efeito dos dois tipos de fotos nos observadores, um pensar-com-os-olhos, o outro sentir-com-a-mente
Estes dois tipos, possíveis em qualquer humano, são nitidamente seleccionados pela cultura vigente. Há culturas mais dominadas pelo primeiro, por ex., "o profundo amigo conhecido no jantar de ontem" (fast friend culture), ou o "amigo de peito" das culturas mediterrâneas.

Esta diferença é também a diferença entre visualizar e olharizar um pôr-de-sol. As técnicas tradicionais de yoga e meditação, não fazendo essa  distinção, deixam claro a dominância do sentir-com-a-mente como o formato desejado.*
[*]- Estas diferenças culturais nos conceitos surgem noutras áreas, inquinando compreensões de metodologias. Por exemplo, o conceito "fazer amor" na educação sexual é descompreendido (misunderstand) se não se distingue o "doing love" do "making love" e sua possível conexão. 
Como experiência, tentar listar diferenças entre ambos e procurar explicá-las a adolescentes ou até a adultos. 
Também como experiência, tentar "encaixar" o conceito de "dever conjugal" numa delas ou, em alternativa, usar o conceito de "taking love". Para finalizar procurar traduzi-las para português.

As técnicas de visualização no apoio à relaxação e à meditação são usadas para provocar mudança psico-afectiva e não criar memorizações de detalhes e do seu conjunto (pensar-com-os-olhos).

Uma das técnicas mais citadas é a prévia identificação de pólos afectivos significativos (filhos, amigos, animais de estimação, cenas de infância, etc) para as introduzir discretamente na descrição da imagem relaxante, por ex., dentro de uma paisagem*.
Esses elementos recordatórios, detonadores de afectividade, funcionam como "triggers" (gatilhos) do aparecer o sentir-com-a-mente. (vide video anterior)

[*]- Descrever a um citadinocomo imagem relaxante, uma cascata e um lago quando ele nunca o viveu e só conhece arranha-séus, só servirá para ele imaginar e reproduzir fotografias mentais. Haverá um aumento de ondas Beta no córtex ao invés de ondas Alfa.
Como exemplo, descrever uma floresta como relaxante a um ex-combatente do Vietname poderá ter o efeito perverso, não de sentir a relaxação de contacto com a natureza, mas a tensão do combate e a angústia do perigo.


5.3 - A vida

Numa linguagem alegórica*, […viver é uma relação entre estímulos e reacção…] em que o córtex é uma espécie de cockpit a gerir ambos.
A cultura, educação, regras, liderança, etc, são apenas formas de organizar esse cockpit para que essa relação se expresse de forma desejada. Obedecer-ao-chefe e não-obedecer-ao-chefe significa apenas a posse de scripts** diferentes ou, então, um deles com avaria.
Na prática, educar é instalar scripts no cockpit humano. Esses scripts são essenciais pois garantem a segurança da relação estímulos-reacção, isto é, da vida***.

[*]- Alegoria quando uma expressão transmite um ou mais sentidos além do literal.
[**]- Script: sequência de padrões, programação, instruções operativas.
[***]- Matar alguém é anular essa relação, ou seja, é transformar o corpo (scripts activos) em cadáver (scripts não activos).

Há scripts automáticos/genéticos, outros culturais/adquiridos e outros geríveis pela vontade. A respiração é um caso interessante porque ela existe nas três condições, é genético, é aprendida com estimulações diferentes (ex., respirar com fumo) e é controlável pela vontade (pranayamas da ioga).

No caso dos humanos estas fronteiras entre genéticos, adquiridos e volitivos são flexíveis e são ainda um mundo cheio de mistérios entre mitos e realidades, possibilidades e impossibilidades.
Assim, uma questão educativa importante é o seu estilo pois, apesar de necessária, o formato da educação não é impune, influencia tanto (ou mais) que o conteúdo..
No caso dos humanos pode considerar-se dois grandes estilos:

1 - Formato rígido - quando a educação dada (scripts instalados) nunca é reformulável, i.é., não aceita aprendizagens, fica instalada e bloqueada. Socialmente é conhecida pelo nome de fanatismos.

Relembrando Charles Darwin com a teoria da […morte de espécies que não evoluem…], será equivalente à incapacidade de reformular scripts, Por sua vez Georges Lapassade com sua ideia do [imaturo nascimento do ser humano que precisa de longa estadia no útero social…], será equivalente à dominância dos scripts adquiridos (aprendidos) sobre os genéticos, podendo deduzir-se que os formatos rígidos não são educações aconselhadas na época actual.

2 - Formato flexível - quando a aprendizagem é constante até ao fim da vida com permanente avaliar, aferir e reformular scripts.

Relembrando A.Tofler e sua ideia de que […os analfabetos do século 21 serão os que não conseguem aprender, desaprender e reaprender e não os que não sabem ler e escrever…] pode deduzir-se a importância neste século do formato flexível.

O ser humano, e a vida que tem, depende muito do tipo de formatação que adquiriu com seus scripts. Na relação estímulos-reacção através do córtex, base do viver, será possível separar a ligação entre ambos? Isto é, fazer uma dupla conexão …EU sou estimulado mas TU reages...

Huau… se isto for possível, começa a ser interessante.
Exemplo:

Se ambos não soubessem que a ligação por eléctrodos era a causa de  um pensar e o outro fazer, ELA pensava que não interferia com o mexer da mão dele e ELE pensava que mexia a própria mão.

Com esta hipótese, a questão que surge é, se esta ligação "por cabo" estivesse a funcionar por "wireless", como seriam as relações humanas com um a pensar e o outro a fazer. tudo não consciente???
Mas outra questão é: -... e se já é assim e já funciona e não sabemos???
Com esta hipótese, outras questões surgem:

- será que ela é uma importante componente das relações humanas?
- será que, desde a aversão até à amizade e paixões, é tudo efeitos deste mecanismo weireless?
- será que a intuição, simpatia, empatia, paixões, é o efeito da separação estimulação e reacção e sua re-união weireless em hospedeiros diferentes?
- será que Romeu e Julieta eram apenas viciados deste weireless em que cada um se agarra a si próprio com a mão-do-outro e que, culturalmente, se chama apaixonados??

- para terminar, uma pergunta… poder-se-á treinar este weireless???

… e um pedido como conclusão…
não se estrague com psicotrópicos a entrada neste mundo misterioso, complexo e disponível para todos nós o vivermos, … e se deixe às crianças a aventura de o viver.

5.4 - Conclusão

Educar é apenas modelar o pensar,… para garantir as decisões desejadas.
Na prática, são técnicas de consertar (to fix) o córtex do outro para ele ficar com processamentos "correctos" e produzir acções "correctas".
Porém, não só o "correcto" é um deus de muitas caras como é instável e mutante:
Fiscalização de fato de banho correcto
pois a variabilidade é regra imutável do mundo do córtex.

Na verdade, não só, nunca há dois córtex's iguais como, por si próprio, cada córtex muda a cada momento.
Em cada segundo o córtex processa 400 milhares de milhões (400 billions*) de bits, isto é, selecciona e adquire novas informações para usar e [...das quais o indivíduo tem apenas conhecimento de 2.000]**.
Deste modo, em cada segundo, ele reformula a sua Base de Dados pelo que pode construir novos pensares, decisões e acções …isto é, tornar-se diferente.

[*]- Um bilião (port) tem 10¹² zeros e um "billion"(ingl) tem 10⁹ zeros pelo que, em português, ele deve ser traduzido por milhar de milhão (10⁹ zeros).
[**]- Dr. Joseph Dispenza, D.C. , Evolve your brain

Isto significa que deve haver duas condições essenciais na formação educativa.
Uma condição é fomentar a flexibilidade, isto é, ela nunca deve ser destruída ou impedida com formatos de rigidez.


A outra condição é potenciar a vitalidade*, isto é, ela nunca deve ser enfraquecida ou adulterada com drogas e/ou padrões de comportamento.
[*]- Morrer é perder a total vitalidade "estímulos-reacção", coma perder a quase total vitalidade, psicotrópicos é perder significativa percentagem dessa vitalidade.

Além de usar o critério das avós […se perde energia e alegria de viver… FAZ MAL] há outro critério que é imprescindível (ver video):

ou seja, falem com eles, ouçam-nos pois comunicar é pôr em comum (estar em comum, sentir) os outros, crianças e adultos.  A primeira condição é considerá-los como únicos, isto é, diferentes e não seres parcialmente clones de nós próprios.


segunda-feira, 7 de novembro de 2016

As crianças, a vida e os antipsicóticos- Parte 3

Continuação de "As crianças, a vida e os antipsicóticos- Parte 1"
                  "As crianças, a vida e os antipsicóticos- Parte 2"
Tema
O córtex é um mundo misterioso cheio de potencialidades desconhecidas e disponível para crianças
ainda não "presas" nas divisórias e paradigmas dos adultos.
 (Victor Hugo) Essas divisórias que nos separam do mistério das coisas a que chamamos vida.
Conclusão
Limitadas por antipsicóticos, as crianças vivem a aventura do pensar… com Vontade-de-fazer-força mas sem Força-para-ter-vontade:

O córtex  precisa de vitalidade e os seus neurónios estão "amolecidos".

Os "considerandos" a seguir descritos não são propostas-tipo para crianças, são apenas um "passeio" sobre o tema. Para seleccionar propostas, o simples e antigo "critério das avós" […se perde energia e alegria de viver… FAZ MAL…] é um bom ponto de partida.

Percurso do pensar
1 - Carroças, carros e aviões
2 - Equilíbrio estímulo-córtex
3 - Estratégia "estímulos versus córtex"
4 - Estratégia "córtex versus estímulos" - Parte 3
     (1. Montar um pónei, 2. Jogo de Ping-Pong, 3. Judo e "outros" sentidos, 4. Andar no fogo)
5 - Córtex versus vida

4 - Estratégia "córtex versus estímulos"

4.1 - Montar um pónei
A formula atrás descrita (parte_1 e parte_2) pode ter uma formulação mais geral dizendo que há um equilíbrio (interdependência) entre as características da estimulação e as do funcionamento do córtex, mas não apenas limitado às suas velocidades, ou refraseando:
Por outro lado, também a formulação anterior de input-output, ou estimulação-resposta, como base da vida poderá ser complementada com um elemento intermédio:
em que o córtex é o elemento de ligação entre os dois factores.


Como exemplo, a "simples" amiba recebe inputs, depois tira conclusões e com o corpo adapta-se ao contexto, transformando-se:
O ser humano, como ser vivo, também  tem incorporado o mesmo mecanismo mas bastante mais complexo, pois integra diversos processos no seu funcionamento :



Na verdade, comparando a criança deste vídeo com a amiba, encontram-se semelhanças e diferenças.

Como semelhança, ambas têm input exterior, obstáculo para a amiba e pónei para a criança, e ambas criam output sob forma de adaptação corporal. A conexão entre os dois está num processo privado e pessoal, a "acção neuro muscular".

Talvez como diferença, reconhece-se na criança uma não-desistência (resiliência?) perante os insucessos e uma vigilante observação do exterior na procura de alternativas. Esta atitude, óbvia na autónoma vontade de fazer vulgarmente chamada "força de vontade", talvez também exista na amiba mas o que se sabe... é que há humanos que não a têm. A questão é: - Porquê?

O vídeo sensibiliza e impressiona, não por ela querer montar o pónei, mas pela sua força de o fazer autonomamente, impulsionada de dentro. Se se reparar, ela não faz "tentativas cegas" mas "tentativas críticas", base da Pedagogia Experiencial.
Na verdade, em determinada altura, a meio dos esforços, ela procura ver se há estribos. Isto significa que está na posição da "acção lúcida", essência imprescindível da vontade de fazer força.[*]

[*]- Paradoxalmente, o método autoritário para treinar força-de-vontade é impedir e bloquear esta essência, ou seja, ao obrigar à obediência esta "mata" o que se quer criar. 
(Ver cultura índios USA, Ruth Benedith, Erik Erikson)

Um interessante diagnóstico de um adito é dizer que [… ele tem grande força de vontade para deixar as drogas pois não desiste apesar de já ter feito 10 cursos com êxito…]. Existe aqui uma lógica maltratada pois são desfigurados dois momentos, a entrada no curso e a saída dele.
O adito ele tem grande força de vontade para entrar no curso mas sai dele com pouca vontade de fazer força. O objectivo de qualquer curso não é fazê-lo com êxito, é usar o aprendido com sucesso.

No caso da criança, instintivamente percebe-se a diferença. A tónica está no fazer força para obter resultados. Assim, poder-se-á distinguir:

- a força de vontade de estar montada;
- a vontade de fazer força (resiliência?para o obter.

Adaptando o esquema anterior a esta formulação, surge um 3º elemento (vontade) da responsabilidade do córtex da criança:
Na verdade, esta influência do córtex-sobre-si-próprio é o centro deste problema.

Na sua forma mais habitual, apesar desta influência dever nascer do interior, a cultura dominante[*] usa a técnica do controlo exterior sob o nome "científico" de autoridade, enquadramento, cumprimento das regras, etc. Em esquema:
[*]- Em sentido contrário, ver cultura índios USA, Ruth BenedithErik Erikson.

Com o método autoritário, a chamada força de vontade torna-se apenas força-em-obedecer a uma autoridade exterior que curto-circuita e põe fora de acção a vontade interior de fazer força.
Como parábola comparativa, quando não tem a que obedecer fica um robô inerte e desligado à espera de ordens.

O paradoxo é que, quanto mais se usa autoridade para aumentar a força de vontade, mais a força de vontade é reduzida e anulada a vontade de fazer força. Em substituição fortalece-se a dependência da autoridade[*].
Também como parábola, é como estar saudável e usar muletas para fortalecer os músculos das pernas e, depois, ao ficar maior debilidade, insiste-se no uso das muletas.
[*] - A rebeldia é essa dependência pela negativa. (cickar)

Como exemplo e em sentido contrário, eis um conselho do jesuíta Inácio de Loyola (séc. XVI), que é semelhante em alguns antigos mestres orientais. Para fortalecer a vontade aconselha actividades "fúteis":

[…por opção pessoal e em segredo, escolher uma árvore para, em dias/horas por si pré-marcados, lhe  tocar e regressar. Repetir sempre com árvores diferentes. O cumprimento deve ser exacto. A única razão para o fazer é ter prometido a si-próprio.]

Analisando este conselho, ele tem características interessantes pois salienta a diferença entre força de vontade e vontade de fazer força:

1 - Em primeiro lugar, é uma acção pessoal e privada, um compromisso do próprio para consigo próprio. Autoridade e obediência exteriores estão fora de jogo, assim como, o ser avaliado por outrem.
2 - Em segundo lugar, não há resultado o obter, tudo começa e acaba no fazer, não se caminha PARA,   caminha-se porque é o fim em si, a promessa.
3 - Em terceiro lugar, é um debruçar-se sobre si próprio, começa na auto-decisão, faz-se e acaba na auto-avaliação.

Na prática é uma análise de desvios entre a lucidez de si próprio e a lucidez dos seus actos. A auto-avaliação é um circuito fechado entre a "vontade de fazer" e a "força do fazer"[*].

[*]- Nos AA (Alcoólicos Anónimos) a auto-avaliação e o auto-compromisso são dois factores importantes. O grupo funciona como uma espécie de "rede afectiva" de apoio mas as decisões críticas do não-beber são "solitárias", isto é, uma promessa de si para si.

Como exemplo e aplicando este modelo ao estudo da matemática, foram criadas fichas com 10 simples somas (subtracções, multiplicações, divisões ou mistas) para serem resolvidas individualmente mas podendo colaborar (perguntar/responder, mostrar etc)  mas sem poder falar.

Era distribuída uma tabuada em papel na qual apenas podiam sublinhar 10 parcelas. Se quisessem sublinhar outras parcelas teriam que entregar essa cópia e receber uma nova.
O objectivo era a tabuada ser um recurso escasso, obrigando a agudizar a lucidez da prioridade do sublinhado.

PS- A criatividade grupal sempre me espantou. Um dos truques usados foi combinarem o que cada um sublinhava e usarem tabuadas uns dos outros. Esta estratégia era divertida porque funcionava bem mas ora ganhavam ora perdiam tempo… era um equilíbrio difícil. 

Também não podiam usar máquina de calcular. A intenção era obrigar a usar e desenvolver a pesquisa e memória do espaço-documental, capacidade fundamental na manipulação de recursos informativos.
Esta capacitação é muitas vezes mostrada na TV em filmes e series. É uma habilidade fundamental e preciosa na investigação, pesquisa e no estudar com documentos e/ou filmes. Exemplo:


Depois das fichas entregues, os jovens deveriam:

1º - Observar e prever o tempo que iriam precisar;
2º - Fazer a ficha sem consultar o relógio.
3º - As contas teriam que estar certas.
4º - Avaliar o resultado, certo ou errado, quanto tempo gastaram e se coincidente com previsão.
5º - Concluir onde ganharam/perderam tempo, se previsão boa/má e o que poderiam melhorar.

A competição era só consigo próprio e o desafio era contas resolvidas cada vez mais rápido e ainda haver coincidência previsão-realização. O foco era a auto-conquista de lucidez de si próprio, de qual a  dificuldade nas contas e da habilidade a resolvê-las. A motivação era serem cada vez mais hábeis e verificá-lo por auto-confirmação[*].
[*]- Isto é, feita não por "avaliação de um juiz" mas sim por "avaliação situacional", como acontece em qualquer jogo de computador.

Era a actividade preferida para começar ou terminar as sessões e queriam sempre tentar mais uma vez. Gostavam, divertiam-se e eram cada vez eram mais rápidos.

Um dia, um deles fez uma previsão bastante inferior ao habitual. Perante a minha admiração explicou que iria consultar menos a tabuada... o que foi verdade. Não só tinha memorizado a tabuada (efeito colateral) como tinha potenciado a vontade de decidir e fazer a melhoria (efeito principal).
Tinha detectado a fraqueza (perda de tempo com cábula), detectado a solução (uso memória) e REALIZADO.

As fichas seguintes continham contas mais complicadas, com mais algarismos e operações diferentes. Com espanto meu, nesta fase, conseguiam sempre prever de forma bastante aproximada o tempo que iriam precisar quando, no início, com fichas mais simples o desvio era grande.

CONCLUSÃO
O córtex treina-se mas isso não acontecerá se a vontade pessoal for enfraquecida por autoritarismo, drogas ou redução de estímulos. É preciso não confundir metodologias de suporte a actos com apoio da mente (actividades) com suporte a mente com apoio de actos (aprendizagem). Aprender passa-se no córtex[*][**]. 
[*] - Não confundir actividade física com educação física (ver exemplos mais à frente).
[**] - Córtex com psicotrópicos não é educável (desenvolvido) é domesticável (carimbado). 

Para terminar, um pequeno vídeo de um ex-alcoólico que "potencia" a vontade de não beber por manter o estímulo presente e controlado pelo córtex:


4.2 - O jogo de Ping-Pong

Quando era adolescente comecei a jogar Ping-Pong. O instrutor dizia-me que era preciso olhar para a bola para poder apanhá-la… lá fui tentando.
Porém, quando comecei a jogar com mais velocidade, esqueci o conselho [...felizmente…!!] e deixei de procurar ver a bola pois elas vinham rápidas, imprevisíveis e "não-visíveis". Fui obrigado a "aprender" a apanhá-las sem me preocupar em vê-las.

Hoje percebo o que aconteceu. Entre apanhar uma bola "molenga"e apanhar uma bola "rápida", o sistema nervoso-córtex tem que se adaptar. Não é só uma questão de aprendizagem (software) é também uma questão fisiológica (hardware).

Mais tarde descobri que a velocidade da bola de ping-pong é entre 160 a 230 km/hora o que significa que um jogador tem entre 4 e 6 centésimos segundo para, com velocidade "supersónica",:


O truque do "olhar para a bola" só serve no início da aprendizagem quando se joga com bolas lentinhas e de "balão". Quando as jogadas são com bolas velozes e "puxadas"(curvas e/ou rectilíneas) tem que "nascer" outra forma de percepcionar e processar estímulos. É preciso o córtex-sistema nervoso adquirir outras funcionalidades e capacitações [*]. 
[*] - No ténis acontece o mesmo, são 4 a 6 décimos de segundo para fazer o mesmo num campo maior.

Aprender a jogar Ping-Pong não é aprender a apanhar uma bola, é aprender a usar um novo sistema neuro-muscular-mental e dominar novas capacidades. É adquirir maior velocidade e sincronismo corporal, perceber discriminações subtis, ter decisões rápidas e previsões eficientes, etc. 

Uma criança que só tenha o tradicional jogo do berlinde e outra que jogue Ping-Pong adquirem  diferentes coordenações óculo-manual-mental e diferentes desenvolvimentos. 
Como analogia, é a mesma diferença de quem passou a vida a controlar uma carroça ou a controlar um carro de alta velocidade. Eles têm diferentes percepções, compreensões, decisões, reflexos, etc. Os padrões comportamentais  de guiar uma carroça não são os mesmos de guiar o carro de alta velocidade.

Conclusão
O "córtex-sistema nervoso", como qualquer músculo, treina-se, desenvolve-se e recria-se, vive em permanente e fiel "concubinato" com os seus estímulos… é um "casamento" para a vida inteira.

4.3 - O judo e "outros" sentidos

Diversos biólogos estudam "outros sentidos" em animais.
Por exemplo, encontram sentido "eléctrico" em enguias, tubarões e raias que, através de campos eléctricos à sua volta, detectam com grande sensibilidade, o "corpo eléctrico" de presas. 

Por outro lado, peixes e aves migratórias detectam com um sentido "magnético" a orientação a seguir, com uma espécie de bússola biológica incorporada. A cobra cascavel com um sentido "térmico" detecta o calor de presas e de seus rastos, usando um instrumento biológico de "termografia". As aranhas com um sentido "táctil vibratório" detectam a presença de estranhos nas teias e comunicam entre si por vibrações num  "telegrafo" biológico  incorporado. 

Para terminar e colocar duas questões em aberto, mais conhecido é o caso do sentido de "radar" usado pelos morcegos. Eles orientam-se por emissão-recepção de ondas sonoras com o "truque" de fazerem tabela.
O interessante é que os  humanos também emitem e recebem ondas sonoras, chama-se "falar e ouvir". Só faltará gerir o efeito recepção em tabela  que, por acaso, também fazem e chama-se "fazer eco".
Na verdade, há casos concretos de humanos invisuais que, no seu quotidiano, usam um "radar biológico" para contornar obstáculos, inclusive andar de bicicleta na rua. A capacitação existe e é utilizável se activada:

Assim, as duas questões em aberto são:
1ª - Se vários animais têm outras estimulações percepcionadas, ENTÃO, o animal humano também as terá "adormecidas"?
2ª - Se houver outras "adormecidas" (outros "sentidos") poder-se-ão desenvolver?
   
Como consequência nasce uma questão cultural: Haverá um bloqueio educativo dos paradigmas instalados? [*]
[*] - A Ciência é o milagre de passar do impossível ao não-possível e depois ao possível.

Como exemplo de paradigmas instalados, as "cegueiras culturais" ou os "impossíveis da cultura" :

Em 13 Set. 1768, em Maine, França, ouviu-se um estrondo e uma pedra quente caiu do céu.
O padre da paróquia local partiu bocados da pedra e enviou-os para a Academia das Ciências de Paris.
Os cientistas, depois de diversas análises, concluíram que [...tinha sido um raio que caíra na pedra e a aquecera pois pedras não caem do céu, porque no céu não há pedras para cair.] (Brian Inglis, 1977, pag. 148-49)

Abandonando, por agora, a dinâmica sempre positiva de discutir os paradigmas de impossíveis culturais e, em sua substituição, pensar eventuais impossíveis possíveis.

Por motivos profissionais, aquando na Marinha, fui durante algum tempo, Director do Centro de Formação de instrutores militares (CEFA). Ex-praticante de judo e box descobri lá uma área que me intrigava e motivava …a luta de olhos vendados:


Com liberdade de movimentos era-me possível ser participante extra em várias aulas de judo e box, sempre testando as expectativas e surpresas destas actividades de olhos vendados.
Na época, a palavra chave era "sentir"… o que quer que isto significasse em termos práticos. 

Muitas vezes, este "sentir" significava respostas correctas no ataque-defesa do que não-se-via-nem-se-previa. Era vulgar quanto isso acontecia o meu treino parar e, entre ambos, tentar perceber o "como" isso tinha acontecido. As conclusões sempre foram confusas.

O interessante é que mais tarde a situação voltou a acontecer-me em condições completamente  diferentes. 
Na época trabalhava na área da psicomotricidade, no Hospital Psiquiátrico Júlio de Matos sob a direcção do Prof. João dos Santos (médico e prof. de Educação Física), apoiando crianças com acentuados transtornos mentais no Centro de Saúde Mental Infantil. 

Em conversas muitas vezes informais com o Prof. João dos Santos, ele dizia [… para perceber as crianças é preciso senti-las…]. Novamente, me aparecia o "sentir" como técnica já encontrada nas artes marciais, mas continuando eu sem perceber "o como fazer".

Um dia num seminário de formação, uma terapeuta inglesa fez um "estranho" treino na área do "sentir".
Dois a dois, sentou-nos no chão costas-com-costas. Alternadamente, dava a um uma ficha com uma palavra identificativa de uma emoção, para ser transmitida ao outro apenas por contacto costas-com-costas.
A palavra significava um "sentir" (alegria, tristeza, raiva, recusa, …) ou, posteriormente, mais difíceis (confusão, conflito indecisão …). 

Quem recebia a mensagem escrevia numa ficha a emoção percebida. Se iguais continuava-se com outra ficha diferente. Esta foi uma actividade diária durante toda a formação e o seu objectivo era para, no fim e em pares diferentes, cada um conseguir pelo menos acertar três em cinco tentativas.
Na essência era um treino duplo do "sentir" não só na emissão como na recepção.

O curioso foi que percebi alguns dos fundamentos base e reparei que eram semelhantes aos conselhos das artes marciais. O importante era usar dois pontos de vista:

- Um  deles era sentir o outro no problema dele;
- Outro era sentir o problema dele em mim.

Como exemplo, no caso da terapeuta, ela dizia que usar aqui a segunda alternativa era difícil pois o problema do treino era fictício (a ficha dada), mas nas crianças era mais fácil pois nelas o problema era real.
Por exemplo, o "truque" era questionar-se: [… sinto que esta actividade a está a assustar, e se EU estivesse na situação dela o que sentiria?] e a partir daqui "ler a linguagem corporal  e sintonizar-se"

Nas artes marciais o conselho dos treinadores era também questionar-se: [… se me fossem fazer o que vou fazer como EU impediria?] e a partir daqui preparar-me para sentir o contra-ataque. No fundo era uma técnica de utilizar expectativas para "sentir" as situações ou, como diz o ditado, "vestir a pele do outro".

Durante os debates e conversas, outra questão se tornou relevante.
Esta técnica de "sentir" era um problema cognitivo de aprendizagem instalada ou era uma transformação de receptores e processadores neurais diferentes?
Por outras palavras, era adquirir um saber ou era adquirir um novo modo de estar? Era aprender uma profissão ou incorporar um "behavioral script" (sequência de padrões esperados)?[*]

[*] - Recordo Franz Fanon (psiquiatra) e a sua análise dos comportamentos dos torturadores na família como cônjuges e pais. Uma conclusão é a possibilidade da profissão incorporada como "behavioral script" ser a entidade educadora da família e filhos.  

Em determinada altura nos debates, alguém disse "brincando" [...é como chegar e todos os dias as crianças serem sempre novas] ao que a terapeuta respondeu de um modo "sério" […quando sentir que elas são sempre iguais... mude de profissão!].

Em resumo, e numa linguagem da IA (Inteligência Artificial), a questão era saber se se trata só de um novo software ou se é também um novo hardware?
Como exemplo prático, o aprender a jogar basquetebol.


Basquetebol é um jogo de 10 jogadores num campo pequeno, com grande interacção, rapidez e decisões rápidas. Exige um constante inter-agir de 10 indivíduos, uns pró outros contra, em situações de rápidas e permanentes mutações, exigindo previsões e decisões de si com os outros para as aproveitar ou impedir.


Se se colocar um novato a jogar com 9 treinados, ele não tem tempo para perceber o que acontece e muito menos para participar nas jogadas. Limita-se a andar atrás dos outros, fora do tempo, do espaço e das relações ...à espera que o jogo vá ter com ele.

Aprender a jogar basquetebol significa aprender a agir por novas e subtis compreensões das situações,  com novos formatos psico-neuro-fisiológicos.
Encestar é importante (coordenação motora) mas, inserir-se nas redes grupais em campo, é fundamental (coordenação relacional)[*].
[*]- No mini-basquete, as crianças começam por jogar e não por encestar. O ponto é feito com a bola a bater na tabela. Depois do prazer de jogar, e se inserir na complexidade da interacção, é que surge o desafio de encestar.

Numa palavra, tornar-se jogador de basquetebol é ter outras/mais aquisições motoras, mentais, nervosas e relacionais. É transformar-se ...mas isso acontece sempre em qualquer desporto ou actividade.

Quando no CEFA, o instrutor profissional de boxe (Ferraz) disse-me várias vezes que, em qualquer conflito ou luta, a primeira decisão é "ver"("sentir") se o outro é boxeur e que nível terá[*] e só depois se decide o que se faz.
[*]- O profissional começa sempre por analisar primeiro a atitude/comportamento (behavior script) do outro. Dizia ele […se um profissional não reconhece outro, não é profissional…].

Na verdade, aprender um jogo é aprender a ser diferente, é mudar o seu software e hardware. Por ex.,  este jogo

obriga a adquirir novas formatações psico-neuro-fisiológicas (behavior script). Repare-se como, nos principiantes da rectaguarda (da esquerda para a direita), cada um tem atitudes diferentes,desde "caça", em "espera", em "procura" até "perdido".

PS - É preciso não confundir Educação Física com Actividade Física. Por ex., não confundir o cross de um caso e do outro. Um cross escolar não é um cross militar. 
Num cross as variáveis a gerir são muitas desde quando aparece a primeira subida (inicio, meio ou fim), qual o seu desnível (pequeno, médio ou grande) e quantas até ao número de pausas activas, etc. 
Um cross escolar não é planeado do mesmo modo que um cross militar e mesmo este deve variar em função do período e do objectivo para ele pretendido, isto é, a sua "carga" não pode ser aplicada através de "apetites" momentâneos do instrutor ou com critérios de "senso comum".

Continuando a procurar resposta ao binómio mente-corpo na aprendizagem, pesquisei as artes marciais com foco na energia.
to-ateuma antiga arte marcial de luta sem contacto físico, foi uma das que me intrigou bastante:


Normalmente esta luta é feita face-a-face mas, em 2.000, Mikio Yamamoto e seus colegas resolveram aprofundar o to-ate com experiências sem ser face-a-face [National Institute of Radiological Sciences, Chiba, Japan].
Colocaram os lutadores em salas isoladas e separadas por três andares. O "atacante" era um mestre chinês de Qigong e o receptor foi filmado e controlado por medidores de resistência da pele e electroencefalograma (EEG). Os momentos dos ataques eram decididos de modo aleatório pelos experimentadores.

As conclusões foram que os ataques coincidiam com alterações no "atacado", visíveis no seu EEG e na resistência da pele. Porém, como causa apenas deduziram a existência de uma "desconhecida" transmissão de estímulos "desconhecidos" que provocavam aqueles efeitos.
Na perspectiva do "atacante", mestre Qigong, a explicação era uma transmissão de Ki (ou chi) que, na linguagem da física actual, poderia ser refraseada como uma transmissão das […pequenas flutuações quânticas de energia de vácuo].

PS- Se compararmos um átomo a um grande estádio de futebol, o seu núcleo seria um berlinde e os seus electrões seriam grãos de poeira, tudo o resto seria vácuo com sua energia. Se somos formados por átomos então somos também formados por uma grande percentagem (99%?) dessa energia de vácuo, talvez com o antigo nome cultural de Ki, Chi, Prana ...(?).

Como conclusão pessoal,
considerando que o lutador de to-ate luta com sucesso com qualquer pessoa, surgiu-me a seguinte premissa:
...se existem "alguns humanos" que podem transmitir energia por "canais e estímulosdesconhecidos, também se pode concluir que "todos os humanos" os podem receber, ou seja,... USAR.

Então, este "mecanismo" energético (o que quer que seja) pertence a todos nós, está à nossa disposição, porque se recebemos só falta aprender a emitir. A potencialidade já existe só falta activar.

Em textos antigos e recentes encontrei alguns comentários:
(em tradução livre,  com comentários a verde do autor)

1  To-ate é a comunicação de energia [flutuações quânticas?] entre parceiros e que se projecta à distância [wireless?]. Sente-se como se o corpo fluísse na água, sensível a subtis influências. Adquire-se grande sensibilidade e percepção do outro, tais como movimentos, intenções, sentires, em fusão [sincronismo?] com ele. 

2  A pessoa projetada experimenta uma sensação nova, não sente a dor de um golpe (blow) [pancada?]. Pelo contrário, sente uma forte sensação de satisfação e uma agradável fusão energética [massagem?].

3  No to-atea pessoa projetada sente-se como sob o efeito de um tratamento radical de bem-estar, como se fosse o "cansaço" de uma massagem de bem estar [relaxação activa?].

4  Do exterior, parece que a pessoa é projetada por um golpe (blow) [pancada?], mas é outro tipo de golpe (blow) [sopro?] diferente do que se recebe em combate normal. 
No combate normal os dois oponentes estão em conflito, a energia de combate golpeia (blow) [pancada?] o outro, provoca-lhe dor e choca com ele, enquanto que no to-ate os lutadores golpeiam (blow) [sopro?] mas estão em harmonia e unem suas energias [sincronismo? sintonia?] . 
Visto do exterior, parecem lutas iguais com técnicas diferentes, mas do interior os golpes (blow) [pancada ou sopro?] são distintos na essência e nas consequências[*]. 


[*]- Este comentário é semelhante ao relato uma criança pequena que, por mero acaso, viu os pais em relações sexuais. A sua conclusão foi que estavam a lutar. 
Realmente, do exterior parece o mesmo mas, do interior, a diferença está  entre trocas de energia agressiva (dor-choque) ou de energia afecto-sensitiva (harmonia-sincronismo).
Extrapolando, será que as paixões amorosas são apenas formas humanas de comunicação energética tipo to-ate? Será que as paixões Romeu-Julieta são variações comunicativas de to-ate?

Segundo alguns pediatras, para um bebé não doente deixar de chorar, não é aconselhável "chocalhar" o córtex com o embalar(*), é preferível um abraço aconchegado (troca energética??) a recordar, reconstituindo, o conforto intra-uterino.
Segundo suas opiniões, um ou dois minutos serão suficientes. Se não resultar, dizem que ou ele tem um problema ou o abraço aconchegado foi de raiva e não afectivo.
[*] - Na verdade num combóio, o seu chocalhar também faz adormecer, não por bem-estar mas sim por mal-estar.

Como conclusão, será tudo a mesma troca energética desde o to-ate até à relação amorosa [*], passando pelas lutas de olhos vendados e a comunicação terapêutica? Será tudo expressões daquilo que o biólogo Rupert Sheldrake chama campo morfogénico?
(*) - Não confundir "making love" com "doing love" ou "taking love", cuja tradução para português não pode ser a mesma. "Making love" não é "ginástica sexual".

Para terminar, uma última perspectiva:

4.4 - Andar no fogo

Em Abril 2001, nos Alpes Italianos, participei num Encontro de Pedagogia Experiencial, em que experimentei andar sobre o fogo:

O processo foi simples.
Depois do jantar, pelas 23:00 fez-se, com carvão de coque em brasa (700º?), um carreiro de 10 metros para descalço se caminhar por ele.
Pelas 22:00 horas, um grupo de voluntários (21)  preparou-se para essa caminhada. No fim, restaram dez, dos quais 2 foram aconselhados a não fazer pelo que os restantes foram para o local. Todos fizeram, nenhum se queimou e, no fim, a planta dos pés continuava normal e rosadinha.

No meu caso, quando acabei estava contente, espantado e curioso. Resolvi voltar ao princípio para repetir e observar melhor. Não foi consentido alegando que "Já não estava no estado" (o que quer que isso fosse) e que me iria queimar.

Dentro do grupo (professores, terapeutas, psicólogos, pedagogos, psicanalistas, etc) as conversas eram muitas e as opiniões variavam. Quando havia vozes descrentes e com dúvidas, alguns/algumas dos caminhantes, por brincadeira e sem discutir, descalçavam-se e mostravam as solas dos pés "bem saudáveis".
Um grupo mais restrito ficou discutindo até às 04:00 da manhã, sem conclusões.

Desde essa momento que este problema me persegue pois não percebo o que aconteceu. Não estava drogado, não foi crença religiosa, o carvão era real e o calor muito nítido no frio da montanha.
A questão é simples: Saber o que me tinha acontecido.

Recordei a preparação, tudo era normal e conhecido (relaxações, activações, estiramentos, respirações controladas, controlo perceptivo e sensorial, visualizações, conscientizações corporais, musicas ritmadas, tambores, etc). Não conseguia reconstituir a sequência mas também não encontrava nada "estranho".
Uma certeza eu tenho... é possível.

Agora o meu objectivo é retomar o "estado fisiológico" em que já estive mas com controlo voluntário no entra e sai. Resolvi ler e estudar livros, relatos e experimentar workshops (Quantum Touch) à procura de "dicas".

Como prática experimental queria poder apagar fósforos devagar com os dedos, sem sentir calor nem queimaduras. Mais ambicioso, era arrumar a lareira acesa com as mãos. O treino continuava, gastava fósforos e o êxito não aparecia. Lareira acesa nem pensar.

Tempos atrás, deduzi que devia estar com a perspectiva errada. Não devia ser um problema de treino mas sim de "switch" (mudar a agulha) nos neurónios, isto é, fazer uma espécie de EAC (Estado Alterado de Consciência).

Se fosse assim, nada havia a treinar excepto encontrar o "interruptor" neural que "mudava a agulha" para um "estado" (EAC) diferente. Por outro lado, se fosse através de treino não se faria numa hora e não se perdia em segundos. Com um EAC isso pode acontecer.

Comecei a pesquisar o córtex e suas ondas e a aprofundar  técnicas de meditações budistas, tântricas, yoga, alfa, teta, etc. A hipótese era que, se conseguisse gerir as ondas do córtex, conseguiria gerir o "switch" que me fez andar no fogo e faria também não me queimar nas brasas da lareira.
O motor da  é acreditar no mundo insondável das potencialidades do córtex.
Ver Pinçamentos: Aventura de pensar e os sentidos
                                 Torre de Pisa e inteligência nos animais e pessoas (ou o idiota prodígio)

Como conclusão final,
o córtex é um músculo que se treina e, como qualquer músculo, as drogas afectam-no. Porém a sua complexidade e potencialidades desconhecidas tornam o uso de drogas uma "roleta russa", ou seja, nunca se sabe completamente quais as consequências.

No caso de crianças em que, por "moda" de hiperactivismo[*], se usam psicotrópicos, parece o mesmo sistema em que, por "moda", se porá óleo de fritar no motor de um Porsche…e depois ele só serve para carroça:

[*] - Psychologie TodayWhy French Kids Don't Have ADHD


Continuação "As crianças, a vida e os antipsicóticos- Parte 4 e última"



quarta-feira, 26 de outubro de 2016

As crianças, a vida e os antipsicóticos- Parte 2


Percurso do pensar
1 - Carroças, carros e aviões
2 - Equilíbrio estímulo-córtex
3 - Estratégia "estímulos versus córtex"- Parte 2
4 - Estratégia "córtex versus estímulos"
5 - Córtex versus vida

Continuação de "As crianças, a vida e os antipsicóticos- parte1"
TEMA/RESUMO:

Com psicotrópicos as crianças são condicionadas (educadas) para conduzir "carroças" (baixa estimulação/actividade) para depois poderem pilotar "aviões" (alta estimulação/actividade), mas o resultado é ficarem [...seres estranhos num mundo que acham estranho].

3 - Estratégia "estímulos versus cérebro"


Esta  estratégia acontece quando se altera a velocidade de apresentação dos estímulos mas se mantém normal a velocidade de percepção do córtex.
Ela pode ser exemplificada com a procura de compreensão de uma paisagem "olhada" pela janela de um comboio a alta velocidade.

Na verdade, quando se olha de frente pelo vidro, a paisagem parece estar "esborratada" a "correr" rapidamente para trás. Os olhos incomodam, há tonturas, dores de cabeça e sonolência, pelo que o resultado é desistir ou adormecer.


O que está acontecendo é que a sucessão dos estímulos "olhados" é muito mais rápida que o tempo necessário para o córtex "digerir" os pormenores e definir uma imagem.

A solução é simples e vulgar, basta olhar para a frente ou para trás do movimento do comboio.


Deste modo, a paisagem parece parada e os estímulos visuais podem ser percepcionados e processados pelo córtex, construindo detalhes, e surge a "fotografia mental" da paisagem.

Em conclusão, 
o córtex, perante a "anormalidade" da estimulação, "decide" uma estratégia de adaptação que lhe permite funcionar. É uma solução semelhante à utilizada automaticamente quando há muita luz, impedindo a percepção dos pormenores.
Neste caso, a adaptação é semicerrar os olhos, o que acontece se o córtex não estiver dopado ou com padrão de baixo potencial de estimulação(*), parecendo hipnotizado pela luz(**).

(*)- Por ex., flacidez e lentidão nas respostas musculares e neuro-musculares.
(**) - Técnica também usada (farolinar) na caça a alguns animais selvagens para "travar" a fuga.

É interessante pensar sobre os "óculos sem vidro dos esquimós".


Na prática são um instrumento de sobrevivência (com milhares de anos) para facilitar o trabalho mental.
Na verdade, a brancura da neve e sua luminosidade "atacam" os mecanismos de percepção e dificultam o funcionamento do córtex no compreender e fazer a "foto mental" do contexto e poder tomar decisões correctas(*).

(*) - Sob o ponto de vista de decoração, secretárias com tampo branco podem ser bonitas e agradáveis. Todavia, experimente-se passar algum tempo lendo texto em papel branco colocado sobre o tampo e sentirão dificuldades de leitura, concentração e compreensão e talvez dores de cabeça e olhos, principalmente se forem crianças. 
Encontrei algumas escolas e empresas com esta decoração.  
O IKEA tem à venda este modelo, porém os óculos de esquimó têm que ser comprados noutro lado.


Filmes

Filmes são uma aplicação interessante da adaptação do córtex a velocidades "anormais" dos estímulos.

Repare-se como alguém muito dopado (embriagado, barbituricado, drogado, etc) não tem motivação para olhar filmes pois a sua compreensão do conteúdo  tem "buracos" e confusões.
No mínimo fica "hipnotizado" pela passagem dos "bonecos" e pouco percebe do que acontece na história. O normal é só querer filmes de "fast OK" ("ver e OK"), como são alguns, não todos, os "filmes de acção" ou "dramas de telenovela" que não é preciso processar.

Filmes são uma sucessão de imagens paradas apresentadas com uma velocidade de 24 por segundo, velocidade essa superior à estimulação normal o que obriga o córtex a um esforço de  compreensão. Na verdade, esta velocidade não permite fixar e compreender detalhes de cada imagem de per si, impedindo o córtex de reconstruir a imagem mental de cada uma.

Para evitar esta condição de "janela do comboio" (já descrita) as imagens apresentadas (frames) utilizam duas técnicas para obrigar o córtex a funcionar de maneira diferente, isto é, não "pensar" em cada uma de per si, mas no seu conjunto.

Deste modo, a "olhadela" da sucessão imagens (filme) permite "visualizar" o movimento, pois o córtex adapta-se e apenas vai dar importância à diferença existente em cada frame e não ao que neles é igual.

EXEMPLIFICANDO

1ª técnica: criar diferenças nas imagens (frames)

O que é que este jovem está a comunicar?


Não é fácil encontrar a resposta porque pesquisar diferenças entre os 6 frames leva tempo e esforço de análise e memória. É cansativo e aborrecido.
Assim, o córtex precisa de uma "ajuda", isto é, precisa alterar o funcionamento"normal" e adaptar-se a um modo de processar estímulos que esclareça o significado.

Por ironia, a solução não é dar mais tempo para "pensar" pois dar uma hora para ver as fotos não ajudará muito. Pelo contrário, se se der menos tempo, apenas um segundo, o córtex perceberá imediatamente.

Porém, esta técnica que é necessária não é suficiente, precisa ser completada por outra e foram as duas que deram origem ao cinema.

2ª técnica: gerir a velocidade e a sucessão das imagens (frames)

No inicio do cinema, foram feitos estudos da "Persistência da imagem na retina" para determinar qual a velocidade ideal para o córtex ter percepção e sensação de movimento. A medida adoptada foi fps (frames por segundo).

Na época, o padrão fixado como desejável foi 24 fps que ainda hoje é usado. Todavia, existem outras hipóteses, hoje consideradas melhores, que criam transições mais suaves. Um exemplo doutros rácios aplicáveis são os 60 e 48 fps como no filme "O hobbit" (2012).

Assim, apresentando as imagens anteriores sob a forma de filme (24 fps) o córtex adapta-se e a compreensão é rápida e eficaz,
 [clickar]


de que o jovem está a "dizer" NÃO.

Se se analisar a sequência das imagens, verifica-se que todos os frames são iguais excepto a mão/dedo, cujas variações são a mudança de posição para a esquerda e direita expressando o significado. 

Conclusão,
devido à imensa variabilidade do meio ambiente, o ser vivo tem necessidade de um orgão com grande adaptabilidade perceptiva que possibilite reações correctas e adaptadas, garantindo a sobrevivência.

O ser humano não é excepção, antes pelo contrário, a sua flexibilidade nervosa-mental é grande e evoluiu muito, desde gerir o fogo na pré-História até conduzir aviões. Inventar e compreender filmes faz parte desse "deslizar" para o futuro.

Assim, debilitar ou entorpecer o córtex é um crime de lesa-humanos pois é fazer um "deslizar" para o passado. Não é evolução para um ser humano melhorado, é involução  para um ser humano estragado com potencialidades perdidas e bloqueado.
PS - Possivelmente hoje, Charles Darwin escreveria também "As regressões da espécie humana".

No nosso século a evolução é óbvia. Dentro da mesma geração, assistimos ao indivíduo recriar-se a si próprio. Profissionalmente, assisti a várias pessoas reformadas entusiasmadas a aprender a usar o computador. Tinham que adquirir destrezas novas como, por ex., controlar o rato sem olhar para ele mas sim para o écran.
Isto significava adquirir sensibilidade motriz controlada por olhar para outro lado, o que no inicio não era fácil pois no écran o rato dava grandes saltos fora do local desejado. O desespero aparecia e  a não-desistência também.

Eu sou do tempo do ZX Spectrum (anos 80), o computadorzinho que timidamente aparecia na sociedade e era apoiado com pequenos cursos para se aprender a utilizar.

Recordo que dei um ZX Spectrum a meus filhos (10/11 anos) que agarraram nele e desapareceram, recusando ensinos. Mais tarde vi-os utilizá-lo divertidíssimos… tinham aprendido com os amigos como na altura se fazia.
Ironicamente, no plano profissional, vi adultos recusá-los ou fazer cursos para os usar. Pouco tempo depois eram "fans" e o computador era um instrumento comum.

Hoje os telemóveis são "pequenos computadores" e não há cursos à venda para a sua utilização, mas vêem-se crianças de 3/4 anos a utilizar tablets e a manipular telemóveis. Muitos hackers (especialistas clandestinos de computação), entre os 11/15 anos, adquiriram competência por auto-formação e por formação informal(*).

(*) - Não há políticos a quererem ser eleitos por prometerem cursos de telemóveis aos eleitores (seria ridículo) mas há professores a proibi-los nas aulas. Todavia, certas escolas e universidades usam-nos para trabalhos grupais e/ou fotografar esquemas e apontamentos no quadro e/ou livros, por "alcunha" chamam-lhe "técnicas de espião"(spy tools).

Conclusão,
o ser humano evolui, o córtex adapta-se e desenvolve-se, entorpecer o sistema nervoso e mental dos nossos filhos é algo que nenhuns pais podem querer ou consentir, não tem sentido estragar as crianças para o bem delas.

A solução não é entorpecer as crianças mas sim activá-las e se são hiperactivos(*) a solução é aumentar as actividades e não reduzi-las e aumentar controlos. As crianças não são robôs que se "desactivem", há sempre efeitos colaterais às vezes inesperados, desconhecidos e sem retorno(**).

(*)- Casos de hiperactivos medicamente reais são diminutos em relação à moda existente (vide os muitos artigos técnicos).
(**)- Por exemplo, os psicotrópicos podem criar aditismo.

Se as pessoas vão para ginásios "espevitar" os músculos e serem iguais ao Tarzan, porque não vão  "espevitar" neurónios para serem iguais ao Einstein?
Afinal isso é possível e não há limites de idade:


pois quando se "espevita" o córtex ele responde sempre.

Três EXEMPLOS para poder "espevitar" neurónios:

A - "Folhear" filmes

Normalmente, há o hábito de folhear livros para decidir se se quer ler ou abandonar. Porque não "folhear" filmes para ver ou abandonar?

Um filme é uma sucessão de imagens captadas da vida real por uma máquina de filmar que fixa (foto+grafa) 24 fotos por segundo. Se depois "olhadas" a 24 fps isso permite ao córtex reconstruir na mente as cenas reais que as originaram.

Porém, se a máquina fotografar, por ex., a 240 fps (ou 500 fps, etc.) existem mais fotos intermédias captadas pelo que, quando "olhadas" mais lentamente a 24 fps, o córtex detecta mais pormenores intermédios construindo na mente um movimento lento.

A sensação de "câmara lenta" (slowmotion), na verdade, tem que ser feita com uma câmara rápida. Pelo contrário, um filme acelerado é feito com uma câmara lenta (18 ou 20 fps) que tira menos fotos por segundo, como acontecia nos primeiros filmes. Depois, quando "olhados"a 24 fps o córtex, ao detectar menos pormenores intermédios, constrói a solução de um movimento mais rápido.
Charlie Chaplin, propositadamente, às vezes filmava com 20 fps, apesar das filmagens já serem a 24 fps, para aumentar a comicidade o que na altura se chamava "defeito especial".

Conclusão
a capacidade de adaptação do córtex, realmente, é uma "prenda" espantosa que a vida oferece e merece não ser destruída ou definhada.
Exemplo:

Filme normal



Filme acelerado




Filme lento (slowmotion)



PS- Os dois últimos filmes por "olhados" a 24 fps, um fica acelerado e o outro fica lento, mas são "batota".  A filmagem inicial a 24 fps foi manipulada em computador e num caso apagaram-se frames (filme acelerado) e noutro acrescentaram-se frames (filme lento). Simplesmente os "novos" frames acrescentados são cópia de existentes portanto não acrescentam mais diferenciação, o que não acontece com filmagens em câmara rápida. O olho não vê a "batota" mas o computador "vê".

Conclusão

Estas três condições fílmicas, normal, rápido e lento, permitem criar condições de estimulação para o córtex e ele poder "folhear" filmes. Assim,

Método
Na primeira etapa, vê-se o filme acelerado o que pode ser feito na BoxTV (gravações ou fora do horário).  Assim,  capta-se a estrutura e seus blocos de pormenores. Portanto, decide-se "ficar por ali" ou guardar para a segunda etapa, como com livros.

Na segunda etapa, oscila-se entre a velocidade normal e acelerada em função de opções pessoais de compreensão. Se se pretender ver alguns detalhes em pormenor, é necessário o computador para criar slowmotion de "batota".
Como ex., uma cena deliciosa de Sean Penn em "21 Grams" (2003) a que chamei "olhos que falam":


Conclusão, 
esta estratégia permite, manipulando o formato e a sucessão de estímulos, activar no córtex padrões de funcionamento diferentes e que estão potencialmente em standby. O ser humano é um ser em desenvolvimento até idade avançada, geneticamente nunca é velho, ou seja, nunca está fora de uso.

Quando se nasce, a primeira actividade é aprender pois é preciso aprender a respirar cá fora, senão morre-se. Depois, o aprender continua até morrer. Entorpecer o córtex é debilitar a actividade de aprender(*).

(*) - Assim, dar psicotrópicos a um hiperactivo(?) para ficar sossegado e, na escola, poder aprender é um contra-senso, é o mesmo que amarrar a criança a uma cadeira para poder aprender a correr.

2º - "Aglomerar" estímulos

Uma pergunta, um baterista com 20 instrumentos é mais desconcentrado de que um flautista que só tem um?



Claro que o simples senso comum responde que isso não é verdade porém, quando aplicado às crianças, o mesmo senso comum actua como se fosse verdade.
Assim, pode-se perguntar, "se se aumentar a quantidade dos estímulos, o córtex funcionará bem ou funcionará mal?"
Aplicando e refrazeando a questão:

  "Porque não se vê dois filmes ao mesmo tempo?"

Decidi experimentar e deixar que o meu córtex "resolvesse" o problema.
Os filmes foram "Avatar" e "Anjos e Demónios":


Olhando para um ponto intermédio, utilizando a visão periférica, funcionou bem e, às vezes até com velocidades diferentes e... no fim eu sabia as duas histórias. 

Na verdade, o meu córtex nunca "resolveu" pôr um avatar no meio de Roma, nem pôr um cardeal em cima de uma árvore na floresta, ou seja, não foi preciso preocupar-me em estruturar significados. O córtex não "baralhou" lógicas, "arrumou" bem as informações e tudo era coerente.

Poder-se-á argumentar que se perde o prazer da arte do cinema, talvez, mas no ginásio manipulam-se pesos para treinar músculos e ninguém argumenta que não é assim que se transportam malas ou se leva os filhos ao colo. Não se pode confundir actividades, ver cinema é ver cinema, treinar neurónios é treinar neurónios.

Resolvi aumentar o "caos" e, agora, tento também ler um livro aproveitando os segundos com frames mais ou menos iguais, por ex., quando o avião levanta voo tenho alguns segundos para ler até ele chegar lá em cima e, depois, regressar ao filme. Aliás, o aviador em crise faz esta multi "actividade-atenção-selecção". Não sou aviador mas também posso fazer.

Sobre os livros, já conclui que ler texto é mais difícil que ler banda desenhada. Tenho ideia que talvez seja porque o texto exige raciocínio sequencial (estilo hemisfério esquerdo) e a banda desenhada exige  raciocínio espacial (estilo hemisfério direito). Assim, ando a procurar ultrapassar a diferença com a técnica de leitura "PhotoReading".

Para terminar, dois exemplos de aprofundar filmes com sua aceleração e com o desenho do "mapa de ideias" correspondente. O filme projecta-se em velocidade acelerada e faz-se pausas para desenhar a rede de relações. A rede desenhada é, posteriormente,  redesenhada e completada num software de mapear. Como exemplo, dois filmes:

1º - "Jogos perigosos"(Misconduct) (2016) com Anthony Hopkins e Al Pacino.
A rede de relações principais:


2º - "13 dias que abalaram o mundo" (Thirteen days) (2000) sobre a crise dos mísseis USA-Cuba:


3º - "Libertar" o córtex

Como exemplo prático, um teste:

Num minuto, encontrar 2 letras
Uma solução é percorrer todas as colunas (ou linhas) até encontrar as letras. 

Outra solução, muito mais rápida, é focar um ponto fora da imagem e deixar que o córtex "em autogestão" as encontre.  Em alguns segundos, elas saltam para o 1º plano da atenção.

Na verdade, o olho tem 2 tipos de receptores (rods e clones) possibilitando uma visão central e uma visão periférica e cria um espaço de profundidade de campo com planos focados e planos "paisagem" por detrás:



Há várias soluções, mas uma relativamente simples é focar um ponto no espaço entre o olho e a imagem  e esperar alguns segundos… e as diferenças "saltam" rapidamente para a consciência da percepção:




A visão periférica "abre" possibilidades de funcionamento do córtex, desde a "divagação cognitiva", como método de análise e estudo, até à dominância do raciocínio espacial (hemisfério direito), passando pela visualização(*).

Uma aplicação interessante está na construção mental a 3 Dimensões que o córtex, saudável e não entorpecido, pode fazer se estimulado por certas imagens gráficas a 2 Dimensões, por ex.:


que é percepcionada num espaço 3D como dois cangurus a jogar boxe, com forma colorida e numa espécie de holograma: 

PS - Há alguns anos atrás, no Casino Estoril,  foi feita uma exposição destas imagens a 2D para serem percepcionadas a 3D.

(*) Visualização não é construir na mente uma fotografia-imagem mental a partir de um relato, construção essa que, numa tradução livre, se poderia chamar "olharização", ou seja, uma espécie de olhar mental. 
Esta técnica (olharização), diferente de visualização, é muitas vezes usada em observação, testemunhos policiais ou outros e memorizações, onde tem grandes vantagens. 

Todavia, quando usada em relaxação, meditação, yoga, rezar, etc. o seu efeito é nulo, talvez apenas uma agradável sonolência. Porém, nestes casos, não se pretende uma actividade cognitiva de construção de imagens mentais (olharização) mas sim modificar o "estado" do sistema nervoso-mental.
Em síntese, a visualização não é um processo cognitivo de fotografia mental (ondas Beta), mas criar um diferente funcionamento do córtex (ondas Alfa ou Teta). As metodologias não são as mesmas. Meditação ou relaxação yoga não são técnicas de imaginização usadas no "olhar mental" (olharização). 

PS - Relaxação com Imaginização dá sonolência e é uma boa solução para a insónia (i.é., querer dormir e isso não acontecer) portanto não é esse o objectivo da meditação ou da yoga.

Como dizem alguns técnicos […na vida normal o corpo está activo e a mente rotinada, na meditação  ou na yoga o corpo está rotinado (parado na posição) e a mente activa]... ou seja, com psicotrópicos só se pode fazer "olharização" (quando ainda se pode) e nunca visualização.

Conclusão final

O córtex está preparado para se desenvolver e se adaptar à multiplicidade e diversidade de estímulos que a vida oferece.

Em síntese, viver são contínuos ciclos no córtex de input/output, ou seja:

              - recepção de estímulos do exterior;
              - agir no exterior partir deles.

No início da vida, estes ciclos contínuos são treinados e desenvolvidos pelas crianças com uma actividade constante chamada brincar.
De um modo simples, as crianças são estimuladas e, em consequência, fazem actividades, como resultado o córtex colapsa em novos funcionamentos, por ex., motricidade fina, coordenação óculo-manual, escolha de opções, comparação de alternativas, etc etc etc.

Nesta perspectiva os psicotrópicos fazem um duplo assassinato psicológico, por um lado debilitam a recepção de estímulos e por outro debilitam a actividade de resposta. Militarmente, é a chamada estratégia de "fazer a guerra em duas frentes" apenas com uma única acção: uma simples pastilhita.

Numa imagem, os seres humanos saíram da pré-História por aperfeiçoar e desenvolver estas duas capacidades e, agora, que elas são prementes, adaptadas e utilizáveis, essas capacidades são debilitadas e as nossas crianças devolvidas, por acção química, às capacidades da "pré-História".

Entorpecer o córtex das crianças com psicotrópicos é o mesmo que, para estarem sossegadas, serem obrigadas a passar os dias amarradas a uma cadeira e nunca poderem viver o correr ou o dançar

Dizer que elas são robôs é uma falsa imagem, na verdade os robôs são máquinas equilibradas e aperfeiçoadas, mas as crianças com psicotrópicos são apenas seres desequilibrados e "mutilados".