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quinta-feira, 7 de dezembro de 2017

Estilo mental japonês



Hoje, no pequeno café onde"acordo" todos os dias com um café duplo e uma torrada, as mesas tinham nova disposição. Estavam juntas para deixar espaço para uma exposição-venda de ofertas de Natal, desde vinhos, doces, chás, até pequenos brindes comestíveis.

O meu habitual silêncio "meditativo" de passar o pequeno almoço a ler, escrever e/ou apenas ver, saborear e pensar... não foi possível.

As mesas para usar estavam todas juntas formando uma espécie de mesa comunal de partilha colectiva ao estilo "Olá vizinho... vamos conversar".

Ao pé de mim sentaram-se duas amigas que, falando ininterruptamente da sua vida, filhos e netos, às vezes em sobreposição, tentavam que participasse na conversa.

Com vários sinais de recepção e fuga (mensagens ao estilo "Olá e Adeus") consegui fazer entender que queria ler. Deixaram-me sossegado e continuámos vizinhos, conhecidos e amigos. O meu problema agora era a conversa que continuava a me envolver com o seu estilo de partilha comunal auditiva.

Entre sair e ultrapassar a partilha oferecida, decidi ultrapassar.

Recordei as casas japonesas de paredes de papel sem qualquer isolamento sonoro. Resolvi imitar a experiência japonesa de deixar de ouvir, ou seja, o som existe, ouve-se com os ouvidos mas não se ouve com o cérebro, torna-se uma espécie de música de fundo que apesar de existir não impede o silêncio, ou seja, no estilo português, é "fala prá iii que não te oiço". 

Primeiro, tentei não perceber os significados e identificar apenas se o som se era alto ou baixo, suas inflexões, ritmos e entoações. Gradualmente o falar transformou-se numa espécie de ruído musicado num idioma não conhecido. Acabei por deixar de ouvi-lo com o cérebro e este focalizou-se na leitura. Fiquei sozinho... recuperei o meu silêncio... Ufff.

De repente regressei ao café e com certo espanto tinha-se passado quase uma hora, continuava na mesa comunal mas sem vizinhos, tinham saído sem eu reparar.

Isto das culturas e das civilizações pode tornar-nos quase extraterrestres uns para os outros, uns só precisam de paredes de papel, outros precisam de paredes com isolamento acústico e algodão nos ouvidos. Nos humanos, o exterior pode ser semelhante mas o interior pode ser complectamente diferente. A espécie humana é realmente um conjunto de diferentes... felizmente.

PS- É preciso nunca esquecer que, há milhares de anos, que é "la petite difference..." (et vive la petit difference) o garante da reprodução da espécie.

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